Já em Monchique, parámos no café Palmeirinha onde, enquanto esperávamos pelos atrasados e tomávamos café, providenciámos os mantimentos para um mergulho nas profundezas da Serra de Monchique.
Depois da compra de carne num talho tradicional, iniciámos a nossa segunda viagem de 14 km a uma zona que o que tinha de inóspito tinha certamente de belo. Depois de uma placa a indicar o sítio da Perna da Negra, continuámos por uma descida que contornava a serra, indo desembocar num vale onde o silêncio era preenchido pela música da natureza pura.
Chegados a Taipas, deixámos os carros junto a um pequeno aglomerado de casas e entrámos noutra época, onde o tradicional e o rural vieram ao de cima: não só no cenário, mas na forma como vivenciámos aquele momento.
Primeiro tomámos consciência de que estávamos sem rede e sem qualquer contacto com o exterior (alguns ainda procuraram rede nos pontos mais altos), mas depressa percebemos que isso nada interessava para uma tarde bem passada entre petiscos de porco preto, prova de aguardente de medronho, cantigas e desgarradas (com laivos de blues), conversas animadas e a descoberta de como se destila o medronho.
Quando chegámos ao rio, a natureza no seu esplendor abre os céus e faz derramar sobre nós uma enorme chuvada. De regresso à "estila" e sem pressas, pois de molhados já não passávamos, sentimos que aquele momento estava previsto e fez-nos sentir o que é estar completamente expostos à natureza. E como se fazia há muitos anos, usámos um processo tradicional para nos enxugarmos: lenha a arder dentro de casa a um canto, numa alcatifa de pedra, libertando o cheiro e uma nuvem de fumo que fez chorar os olhos menos habituados a estas coisas.
A festa continuou pela noite fora e ninguém sentiu frio, pois o calor humano era muito; sentia-se nas conversas, risadas e nas cantigas de improviso. Houve mesmo a revelação de cantores e foi gravado o inédito êxito "Na minha 4L, no mê da estrada".
Quando toda a gente já pensava que a noite estava terminada e pouco mais haveria que nos surpreendesse é chegado o momento em que aparece um grupo de músicos ingleses que se juntaram à festa e fizeram um espectáculo para todos nós. De forma mágica, entre pipas de medronho, surgem duas guitarras, um contrabaixo e um saxofone acompanhados pelos seus tocadores, emanando um som, variando entre o jazz e o rock dos anos mais remotos. O pessoal foi-se acomodando pela casa de paredes pretas de pedra e de barro e fizeram uma roda à volta dos músicos, deixando a um canto o alambique a deitar a aguardente...